PL 2.390/15

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Cadastro Nacional de Acesso à Internet

Autor: Pastor Franklin – PTdoB/MG
Relator CCTCI: Angela Amin – PP/SC

Ementa: Altera a Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), criando o Cadastro Nacional de Acesso à Internet, com a finalidade de proibir o acesso de crianças e adolescentes a sítios eletrônicos com conteúdo inadequado.

ORIENTAÇÃO DA FRENTE DIGITAL: CONTRÁRIA AO PROJETO.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

Os problemas do texto são inúmeros e envolvem questões de ordem jurídica e constitucional, técnica e até mesmo econômica, como reconhece o Comitê Gestor da Internet no Brasil – CGI.br. Antes de mais nada, o projeto subverte os princípios e conceitos fundamentais da internet, não compreendendo sua dimensão como um um potencializador de direitos. Embora a proteção das crianças e adolescentes seja fundamental, as medidas previstas são inefetivas e ameaçam a liberdade de expressão, a privacidade dos cidadãos e os direitos humanos em nome da vigilancia em massa.
O Marco Civil da Internet já dispõe de mecanismo para notificação e remoção de conteúdo de nudez e atos sexuais, bem como de controle parental para conteúdo entendido como impróprio a seus filhos menores. Da mesma forma, o Estatuto da Criança e do Adolescente trata de maneira bastante pormenorizada o tema da produção e comercialização de material pornográfico que envolva crianças e adolescentes. Com efeito, a proposta de filtragem e bloqueio de conteúdos em muito se aproxima ao modelos adotados por governos autoritários.

EDUCAÇÃO – Apesar de mecanismos diferentes, os riscos aos quais as crianças estão sujeitas nas redes são similares aos quais estão sujeitas no mundo real. Não é por meio de um cadastro obrigatório que se resolve o problema da vulnerabilidade de menores no uso de tecnologias, mas a partir de políticas públicas de educação. Além disso, o texto marginaliza o papel dos pais em exercer controle sobre qual tipo de conteúdo seus filhos podem consumir, tornando-os coadjuvantes na condução dessa parcela crucial do processo educacional. Como dispõe o Marco Civil da Internet, existem diversos programas e aplicativos para o exercício de controle parental quanto ao conteúdo visitado por crianças e adolescentes.

EXPRESSÃO E PRIVACIDADE – A proposta representa um retrocesso no ambiente e uma ameaça a direitos fundamentais, haja a vista a instauração de um vigilantismo estatal. Qualquer pessoa que não esteja cadastrada teria o acesso à internet bloqueado. A identificação de um usuário na rede aumenta o risco de censura e perseguição online, bem como viola a privacidade. A elaboração de uma lista de sites com conteúdos inapropriados abre espaço para decisões arbitrárias, violando a liberdade de expressão. O mesmo ocorrerá com as plataformas digitais em que os usuários criam os conteúdos, pois os provedores de aplicação precisão controlar tudo que é divulgado no mundo conectado. Não somente, mas não o texto não define o que vem a ser “conteúdo inadequado”, a despeito de a expressão ser empregada no texto do projeto para prescrever deveres e sanções, aumentando os riscos de censura.

INVIABILIDADE – Entre as diversas causas de inviabilidade prática e técnica, destacam-se a imposição de dependência dos softwares instalados pelo fabricante, impedindo liberdade de utilização de sistemas operacionais, e a criação de entraves à entrada de produtos eletrônicos importados, restringindo a liberdade de escolha dos consumidores. Além disso, a exigência de documento de identificação de crianças e adolescentes para que possam usufruir da internet desconsidera que muitos sequer possuem tais documentos.
A internet possui ainda características específicas que devem ser consideradas pelas iniciativas legislativas. Ocorre que não é possível a um provedor de aplicações saber se quem acessa seus serviços ou funcionalidades é ou não é criança ou adolescente. Da mesma forma, portais online, mecanismos de busca, sites de modo geral e outros serviços conectados não têm como saber se o usuário que visita o site ou utiliza o serviço é efetivamente menor de idade ou não.
Um desses atributos é o fato que dezenas de usuários da internet, em uma rede local, muitas vezes compartilham o mesmo Endereço IP, impossibilitando o controle de cada um deles. Outro ponto importante é que a divulgação de conteúdo não se dá unicamente por meio de sites, mas também de forma pulverizada por meio de aplicativos de mensagens e plataformas colaborativas e abertas, em que o conteúdo não é gerado no modelo “de um para muitos”, mas sim “de muitos para muitos”. Ou seja, a pretensão de catalogar todas as páginas eletrônicas que disponibilizam conteúdos inadequados é impossível, pois não apenas o cadastro estaria constantemente desatualizado, como também a divulgação desse tipo de material ocorre por outros meios.

TRATAMENTO DE DADOS – A obrigatoriedade de cadastro significa um estímulo à coleta maciça e desnecessária de dados, o que contraria objetivos, princípios e direitos estabelecidos com o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados. O que é cada vez um risco maior, considerando os cada vez mais frequentes vazamento de dados, inclusive de sistemas governamentais

ONEROSIDADE – A obrigatoriedade de sistemas de controle nos terminais de acesso oneraria a indústria de bens de informática, o que, inevitavelmente, será repassado ao consumidor final. A base de dados de usuários e sites teria que ser exportada e sincronizada com os milhões de provedores de conexão à internet, exigindo um processo longo e custoso de implementação. Essa infraestrutura ainda teria uma grande possibilidade de falhas em todo o processo e desconsidera a natureza internacional e globalmente distribuída da internet.

RESPONSABILIDADE – A tentativa de responsabilizar, inclusive penalmente, quem deixe de comunicar que o seu conteúdo disponibilizado ao público em geral é inadequado para acesso por menores é também outro aspecto a demonstrar a inadequação do texto, pois permite que provedores de aplicações de internet sejam responsabilizados por conteúdo inserido em suas plataformas pelos usuários e sobre o qual não têm qualquer controle.

O presente projeto, portanto, e qualquer outro que imponha limitações desproporcionais — especialmente quanto aos direitos fundamentais à intimidade e privacidade — devem ser rejeitados.